Coluna: Músicas de São Paulo

Músicas de São Paulo

Texto e Arte

Sampa; a São Paulo que amo

Gabriel de Goes Gabriel

@gabrieldegoesgabriel

“Para mim é um hino de SP”, disse Caetano Veloso sobre sua composição; Sampa.

Ao ler essa colocação de Caê, uma provocação aflora em minha mente: será que para as gerações mais recentes, essa canção é um hino? Será que a famosa esquina (Ipiranga com a Avenida São João) segue icônica? 

Quando criança, lembro de andar de mãos dadas com minha mãe pelo centro de São Paulo e toda vez que passamos por essa esquina, eu olhava para cima (para conseguir ver as placas) e pensava: Nossa! Então essa é a esquina que aquele moço canta na música que meu pai e mãe escutam direto?

Trinta e tantos anos depois, sinto a mesma coisa ao passar por esse lugar. Na verdade, hoje com uma provocação mais profunda: O que será que minha mãe, uma mulher negra e nordestina, sentiu ao passar por esse lugar pela primeira vez nos anos 70?

Tenho certeza que ela sentiu muito orgulho dela mesmo por estar “vencendo na vida” na maior metrópole do país. Orgulho de ir em busca do seu sonho, mesmo indo contra a vontade do meu avô.

Imaginem quantas histórias esse ponto não carrega, quantas pessoas passaram e passam diariamente por lá e quantos sonhos transitam por baixo das duas placas que se encontram formando um ângulo de 90 graus.

É importante lembrar que uma outra música que retrata o cenário paulistano foi inspiração para a composição de Sampa, esta canção é Ronda, de Paulo Vanzolini. 

Outro ponto que serviu como inspiração na hora de compor foi o fato de Caetano morar na época próximo ao famoso cruzamento. Ironicamente, a letra foi escrita quando o cantor estava no Rio de Janeiro.

Curiosamente a grandeza de São Paulo retratada na canção, não foi sentida pelo compositor nos anos 60: “Cheguei com a [Maria] Bethânia, e a cidade nos pareceu feia, não parecia grande… nos pareceu provinciana, com aqueles cartazes de cinema de mau gosto. Tinha algo de cidade do interior”.

Se existe uma coisa que esta cidade tem é o poder de mudança, tanto a física como a forma com que a enxergamos com o tempo. Tanto que no disco Muito de 1978, Caetano deixa claro o seu “novo olhar” com relação a São Paulo.

Acredito que muitas pessoas não sabem, mas a música foi feita pelo Gilberto Gil, ou seja, letra de Caetano Veloso e música de Gilberto Gil.

“ É uma canção que eu fiz sobre um poema extraordinário de Caetano, aquelas coisas extraordinárias que ele escreve. A música saiu bonita também.” comenta Gilberto Gil no disco Unplugged, 1994.

Sim, Gil! 

A música é linda!

A letra é linda!

Eu poderia destrinchar a letra inteira neste texto/ensaio/pensamento, mas acredito que arte está aí para cada pessoa sentir e descobrir o que faz sentido naquele momento.

Somos momentos e somos eternos, como a arte e como Sampa.

Viva São Paulo.

Toque a sua Sampa

C7M                Bm7(11)        E7(b9)   Am7M  Am7  Gm7  Gb7(#11)

Alguma coisa acontece no meu coração

          F                                       A7                                    Dm7

Que só quando cruza a Ipiranga e a avenida São João

            G7                                         G#°                           Am7

É que quando eu cheguei por aqui eu nada entendi

    D7(9)

Da dura poesia concreta de tuas esquinas

                                                                          Dm7  G7  G7(b13)

Da deselegância discreta de tuas meninas

 C7M                               C7(9)

Ainda não havia para mim Rita Lee

    F7M                                      F#°

A tua mais completa tradução

C/G          A7          Dm7        G7           E7      A7

Alguma coisa acontece no meu  coração

       D7(9)                            Abm6

Que só quando cruza a Ipiranga

             G7                 C6(9)    G7(13)  G7(b13)

E a avenida São João

           C7M                                   Bm7(11)

Quando eu te encarei frente a frente

     E7(b9)           Am7M  Am7  Gm7  Gb7(#11)

Não vi o meu rosto

        F7                                       A7                                       Dm7

Chamei de mau gosto o que vi, de mau gosto o mau gosto

G7                               G#°                           Am7

É que Narciso acha feio o que não é espelho

     D7(9)

E a mente apavora o que ainda não é mesmo velho

                                                                                              Dm7(9)     G7(13)  G7(b13)

Nada do que não era antes quando não somos mutantes

     Gm7                     C7(9)                                                 

E foste um difícil começo, afasto o que não conheço

 F7M                                                          F#°

E quem vem de outro sonho feliz de cidade

   C/G            A7              Dm7            G7       E7       A7

Aprende depressa a chamar-te de realidade

           D7(9)                        Abm6

Porque és o avesso do avesso

     G7              C6(9)          G7(13)  G7(b13)

Do avesso do avesso

    C7M                           Bm7(11)

Do povo oprimido nas filas

         E7(b9)   Am7M  Am7  Gm7  Gb7(#11)

Nas vilas, favelas

      F                                  A7                                   Dm7

Da força da grana que ergue e destrói coisas belas

      G7                          G#°                               Am7

Da feia fumaça que sobe apagando as estrelas

        D7(9)

Eu vejo surgir teus poetas de campos e espaços

Tuas oficinas de florestas

                              Dm7(9)    G7(13)  G7(b13)

Teus deuses da chuva

 Gm7                       C7(9)                                        F7M

Pan-américas de Áfricas utópicas, túmulo do samba

                          F#°

Mais possível novo quilombo de Zumbi

      C/G            A7          Dm7           G7        E7      A7

E os novos baianos passeiam na tua   garoa

            D7(9)                   Abm6        G7             C6(9)

E os novos baianos te podem curtir numa boa

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